domingo, 13 de outubro de 2013

...it's all too much/for me to take...

Há muito tempo eu tive um sonho. Foi em 1994 se não me engano, onde eu perdia uma carta do meu taro. Na verdade, eu andava por um lugar cheio de barrancos e lembro de num determinado momento ver uma carta do meu taro largada pra trás, no chão. 
Era a carta do Enforcado.

O Enforcado do tarô mitológico é Prometeu, mas tinha uma certa semelhança fisica com Cristo. Nessa época eu tinha uma visão até meio positiva dessa carta, mas com a idade e experiencia, posso dizer que essa é uma das mais amargas cartas do taro. Ela representa o beco sem saída, a esterilidade de algo que não vai mais vingar. Claro que ela tb pode significar a consciência do que está travando, o momento da espera, a ausência de controle e tudo o mais, mas na minha experiencia pessoal, essa carta sempre significou: That's it folks, desse mato não sai mais coelho nenhum. It's dead.


Quando comecei a pensar em fazer videos quinzenais  com temas variados, comecei por Dionísio e os titãs porque desde de James Hillman, a ideia dos titãs me fascina. Guilherme, meu parceiro nessa empreitada, me emprestou um livro sobre Dionísio e de repente la eu percebo uma coisa que eu nunca tinha percebido antes:

Prometeu é um Titã!
Caramba, isso foi um choque tão grande quanto perceber que a "esperança" da caixa de pandora também é um dos males do mundo. 

Sobre Cronos eu ainda não consegui entender bem e vou deixar pr'uma outra oportunidade, mas no caso de Prometeu o fato dele dar o "fogo" aos homens muda totalmente de figura exatamente por ele ser um titã. Titãs representam forças desagregadoras, desregradas, poderosas e sem unidade. 

Falando de uma maneira bem crua, é mais ou menos isso: Prometeu é um Titã, logo e tem o principio da rebelião pela rebelião dentro de si. Quando ele dá aos homens o fogo dos Deuses, ele faz isso muito mais para provocar Zeus e ver o que acontece do que por simpatia pela humanidade. Daí a semelhança com Lucifer.

Espero não estar entendendo errado, mas segue um trecho que ilustra o incomodo que senti quando associei a imagem de Prometeu a de um Titã:
"O sentido do mito se esclarece pelo próprio sentido do nome Prometeu, que significa o "pensamento que prevê". Descendente dos titãs, ele carregaria em si uma tendência a revolta. mas não é a revolta dos sentidos que ele simboliza, é a revolta do espirito, do espirito que quer se igualar à inteligência divina, ou pelo menos tirar dela algumas centelhas de luz. Não é buscar o espirito por si mesmo, com vistas a uma espiritualização progressiva de si, mas é utilizar o espirito com fins de satisfação pessoal." Dicionário de Simbolos pg.746

É impossivel pra mim não lembrar do Hillman falando das enormidades destruidoras, ou mesmo, mais recentemente, do George Carlin falando do como ele gostaria que tudo na Terra terminasse ao final de "Life is Worth Losing". 

Provérbios 16-18: Pride goes before fall. Hubrys. As enormidades que nos entorpecem. Tudo isso é consequência de um conhecimento dado irresponsavelmente. Quando você dá o fogo ao homem, e dessa forma a capacidade de transformar a sua realidade, está sendo dado também de quebra a falta de limites e a ambição de querer chegar até onde estão os deuses.



Eu sempre digo que Joseph Campbell e Jung mudaram a minha vida. Mas preciso fazer uma menção honrosa a James Hillman que me explicou o Apocalispe no seu livro "Cidade e Alma":

"O mundo não exige crença. Ele exige observação, atenção, valorização, cuidado.
Por causa do fim da era da fé judaico-cristã, é bastante aceitável encontrar muita gente, hoje em dia, saudando o Apocalipse. Uma vez que a própria crença sucumbe, o fim do mundo anterior, sustentado por antigos Deuses, já está aqui. somente através de um fim do mundo - como está escrito em João e preestabelecido pelo mito de nossa civilização - os Deuses poderão retornar."Cidade e Alma pg.143

Meu querido Carlin pode falar melhor disso nesse video:




"Sejamos bem claros: nossa civilização revela uma destruição horrivel, imensa, monstruosa, escrita em seu Livro Sagrado. Esse, em cada quarto de hotel, ao lado de cada cama, elemento de cada crisma, casamento, funeral e juramento, é o Livro no qual a enormidade de um apocalipse estabelece seu capitulo conclusivo. 
(...)
Na ausência dos Deuses, as coisas tendem às enormidades. Um sinal da ausência dos Deuses é a imensidão, não meramente no reino da quantidade, mas a enormidade no reino da qualidade, como uma descrição horrivel e fascinante, como o Buraco Negro, aglomerados, Guerra nas Estrelas. Quer se manifeste nas imagens de corporações internacionais, oceanos poluídos ou nas grandes variações climáticas, a imensidão é a confirmação do Deus ausente. Ou, digamos, que os atributos divinos da onipotencia, onisciencia e onipresença se tornam Deuses. Em outras palavras, sem os Deuses, os Titãs retornam."
Cidade e Alma pg.144

Esse conceito de titanismo de Hillman sempre me foi fascinante. Isso, unido as palavras de Jung, "Omni festinatio ex parte diaboli est" - toda a pressa é demoniaca - coroa a sensação de incômodo que sinto quando pressionada a "cumprir prazos" e "atender demandas".


"A raiz da palavra Titã significa: "esticar", "estender", "expandir" e "empenhar-se" ou apressar". A própria etimologia de Hesíodo (Teog., 209) de titenes é "esforçar-se". Essa tentativa de se esforçar, empenhar-se, sugere que a maior reclamação contemporânea de stress é a sensação do ego prometeico de seu titanismo. (Prometeu talvez seja o mais conhecido dos titãs, e a personagem que Kerenyi chamou "o arquetipo da existência humana" assim sugerindo a propensão titânica em cada um de nós). O stress é um sintoma titânico. Ele se refere aos limites do corpo e da alma, tentando conter o ilimitado titânico. Um verdadeiro alivio do stress só começa quando podemos reconhecer seu verdadeiro antecendente: nossa propensão titânica."
Cidade e Alma pg.145


Um parêntese sobre essa propensão titânica: Em uma entrevista vista há poucos dias, Carlin menciona o momento em que ele saiu do "mainstream" da comedia dos anos 70 e passou a se apresentar em clubes, campus de universidades e na recém criada TV a cabo, no caso, a HBO. Nessas circunstancias ele podia dizer o que queria, ser quem ele era e foi ai que ele se imortalizou. 

Em que momento o homem moderno perde o foco, sai do que realmente é e passa a atender demandas titânicas que deixam apenas o vazio? Em que momento que, de fato, entramos no "redemoinho do ralo"?!?



A vida é muito simples, temos e também não temos muito a perder.

"Podemos notar uma diferença entre o titanismo e hubris. Hubris é o erro humano de esquecer os Deuses. Quando esquecemos ou negligenciamos os Deuses, passamos dos limites estabelecidos por eles sobre os mortais, limites dados principalmente por Zeus, atraves de sua união com metis, Temis, e Mnemosine.
O titanismo, portanto, acontece no nível próprio dos Deuses. Não somos titãs nem podemos nos tornar titânicos - somente quado os Deuses estão ausentes o titanismo pode retornar ao mundo. Vocês compreendem porque devemos manter os Deuses vivos? O "pequeno é belo" requer um passo anterior: o retorno do Deuses.
Cidade e Alma pg.145

E no meu antigo Taro Mitológico um grande cataclismo anunciado acontece entre as cartas 9, 12, 17 e 22! 


"Além de Zeus, um inimigo particular dos Titãs foi Dionisio, que foi despedaçado por eles. O que isso diz a nossa condição de agora? Se Dionisio é o Senhor das almas, como foi chamado, e Zoé, Deus da vida, o vigor verde e orvalhado que impregna toda a natureza vegetal e animal com um desejo selvagem e tenro de viver, então esse impulso pode ser despedaçado, podemos dizer atomizado, por qualquer procedimento, ambição, lei universal que ultrapassem os limites. Até mesmo o impulso prometeico de beneficiar a humanidade com ações nobres pode ser destrutivo para a delicada força da alma, cujo senhor é Dionisio. Grandes soluções e idéias universais fazem da enormidade que estive chamando de titânica. Neste ponto, devemos recordar o aviso de Yeats: "A mente que generaliza impede a si mesma daquelas experiências que lhe permitam ver e sentir profundamente.""
Cidade e Alma pg.145

É muito clara aqui a ideia de que a fragilidade da vida é a força que nos torna humanos. Sem isso, seremos apenas um bagaço do sistema, como a cena em que se desmascara Darth Vader e tudo que há ali é uma "casca de gente", a humanidade foi perdida há muito tempo.

É, Lisa Marie estava certa na analogia que inconscientemente fazia do pai. Isso foi o que foi feito de Elvis. O sistema o triturou e devolveu o bagaço no chão do banheiro do, agora longinquo, agosto de 77 sem que ele tivesse tido tempo de achar inspiração para respirar de novo.




Concluindo, fica mais fácil tentar entender Dionísio colocando Prometeu no seu devido lugar, assim como sua parceira - que agora virou sidekick de vilão mesmo que de forma indireta - Pandora. Como está escrito no Dicionário dos Simbolos, pg. 680: "A mulher é o preço do fogo." E a aparência de Cristo que Prometeu me suscitava caiu totalmente por terra. Cristo é Dionisio: a fragilidade da vida que trucidada redime a natureza humana e, quiçá, divina.



Ah, em tempo: sobre Cronos, basta dizer que, nesse meio tempo em que escrevia esse texto, descobri que existe Cronos, o Titã, e existe Chronos, o Senhor do Tempo. Sendo entidades diferentes, isso acalma um pouco o burburinho do meu Olimpico Tarô....
E, sim, me faz ter certeza de que o Kronus que vi na mandala da minha amiga Monika em 2007 era o Titã do Redemoinho do Ralo, e não o Senhor do Tempo.
Análise de Phaseolus vulgaris L dentor do contexto socio-comportamental e outras bobagens.